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  • Cefas Alves Meira

Causos: Parreiras e os bastidores do rádio



O Blog do Cefas estreia hoje uma nova categoria no portal, “Bastidores”. Depoimentos, na verdade causos, contados por profissionais de comunicação das Gerais, a maioria deles membro do Veteranos da Amizade, grupo do Whatsapp criado pelo publicitário José Maria Vargas. Essa comunidade acaba de completar seu terceiro aniversário, comemorado no último dia 30 de março no restaurante do Minas Tênis I.


E o radialista Ricardo Parreiras, focalizado hoje no “Bastidores”, recebeu uma homenagem especial no almoço do Veteranos da Amizade, pelas suas nove décadas e meia de vida, e pela sua brilhante contribuição para o rádio em Minas. O almoço foi visto por muitos também como um desagravo a Parreiras, pois em fevereiro, véspera do carnaval, havia sido demitido sumariamente pela direção da Rádio Inconfidência, onde trabalhava há 75 anos.


Nesta entrevista, tive a prestimosa ajuda do publicitário Hamilton Gangana, amigo de décadas do Parreiras.


Bem, com a palavra o grande Ricardo Parreiras:


“Nasci em pequena cidade, Bonfim, Vale do Paraopeba. Terra do carnaval a cavalo. Fiquei lá até os três anos, quando minha família veio morar em Belo Horizonte.


“José Parreiras der Oliveira é meu nome de batismo. E como virei Ricardo Parreiras/ Quando fui tentar a carreira de rádio, todo mundo falava que eu cantava muito bem, procurei a Inconfidência. Essa mesma Inconfidência que me demitiu aos 95 anos, só que a diretoria na época era outra, mais humana. Ano de 1948. Lá me encaminharam ao professor Elias Salomé, era o chefão da na rádio. Fiz o teste com ele. Levou-me ao estúdio, sentou-se ao piano e disse – canta uma música aí! A primeira canção que me veio à cabeça foi Ontem à Tarde, de Orlando Silva. Meu ídolo até hoje.



Banner, redação de Hamilton Gangana, entregue a Parreiras no almoço dos Veteranos em sua homenagem

“O Elias então disse, você canta muito bem, vou te colocar na Escola de Rádio. Era um programa semanal de calouros. Mas cismaram com meu nome, José Parreiras de Oliveira, muito comum. Aí, fomos, eu e o professor Elias, testando outros nomes fantasia, hoje chamados fakes, até chegar a Ricardo. Gostei, gostamos, eu e ele.


“Fiquei no programa de calouros seis meses, aí houve uma competição interna de melhor cantor. Participei e ganhei em primeiro lugar. A Inconfidência ficava na Feira de Amostras, prédio histórico lindo, um pavilhão, não sei por que derrubaram para construir a rodoviária. Única cidade no mundo que tem a estação rodoviária no centro da cidade, e derrubaram a Feira para cometer essas imbecilidade.


“Bem, ganhei a competição com seis meses de rádio, e me chamaram para assinar um contrato simples, nada formal, vigência de um ano. Passei a fazer parte desse privilegiado cast de artistas da rádio. Além de cantor, acumulava outras funções na emissora, fui chefe dos locutores, produtor de programas musicais, de programas humorísticos. Participei do cast de radioatores. Só não fazia a voz de galã, minha voz não tinha esse perfil. O Jairo Anatólio Lima, aquele vozeirão bonito, sempre era o galã no microfone, nas radionovelas. Eu redigia também textos para os locutor lerem. Não existia tinha gravação prévia, o locutor lia ao vivo. Depois foi que surgiu o gravador de acetato, grande novidade então naqueles anos 40.


“E fui crescendo profissionalmente na Inconfidência. Fui de cantor a diretor da rádio. E agora me mandaram embora. Depois de 75 anos de Inconfidência, aos 95 anos de idade descobriram que eu não era concursado. Ignorância, burrice, pra não dizer outra coisa. Não havia na época concurso público. Nem contrato de trabalho formal, de carteira assinada como se diz, não existia naquela época. A gente recebia cachês, bônus, e até presentes como viagens, era salário indireto.


“Bem, vamos em frente. Boas lembranças, agora. Nos anos 40, 50, passaram pela Inconfidência diretores competentes, que nunca agiriam como a direção da emissora de hoje. O escritor Murilo Rubião, meu amigo, que foi três vezes diretor-geral da Inconfidência. Ney Octaviani Neves, outro amigo, que depois foi ser diretor de RH do jornal Estado de Minas. Francisco Lessa, o Chico Lessa, outra fera na gestão da rádio. Engraçado, uma pessoa que pra mim foi o melhor diretor da Inconfidência não conhecia nada de gestão, de direção. Era o jornalista e publicitário Élzio Costa, de Ponte Nova. Élzio chegou a BH para jogar bola no América, era craque. Mas ganhando pouco no Mecão, recebeu convite para trabalhar na Inconfidência, nomeado pelo então governador Magalhães Pinto. Onde chegou, a pedido nosso, a diretor-geral. Pedido esse encaminhado pelo José aparecido de Oliveira, o Zé Aparecido de Conceição do Mato Dentro. Ele era RP do Banco Nacional, cujo dono era o Magalhães Pinto. Depois sucesso como diretor da Inconfidência, Élzio entrou no mercado de vez, tornando-se publicitário.



Nove décadas e meia de vida. Exemplo de dignidade e profissionalismo

“Uma curiosidade. Na Inconfidência surgiu a semente do The Voice Brasil, que dá tanto Ibope hoje.. A rádio lançou um programa chamado Tribunal de Calouros, copiado da Rádio Nacional do Rio. O júri era formado pelo jornalista José Maria Rabelo, fundador do jornal Binômio, que ficava de um lado da tribuna, o Zé Aparecido do outro lado, e o locutor Seixas Costa no centro, como juiz. Se o calouro fosse aprovado, continuava na disputa, até consolidar sua competência e se firmar como cantor de fato”.

“Sabe qual artista, cantor, que encantava os belo-horizontinos, os mineiros em geral naquela época? Luiz Gonzaga. Quando ele e seu acordeon vinham a BH cantar na Inconfidência, a cidade enlouquecia. As pessoas faziam filas quilométricas ao redor da Feira de Amostras, dobrando quarteirões, pra ver o cantor de Asa Branca. O Gonzagão ficava sediado em BH, fazendo temporada, hospedado no Oeste Hotel, e de lá ia para cidades num raio de 100 quilômetros como Sete Lagoas, Brumadinho, Ouro Preto e outras”.


“Publicidade. Eu era bastante conhecido no meio publicitário. Participava de spots, comerciais e outras mensagens publicitárias no rádio. A amizade com os publicitários na maioria das vezes ultrapassava os limites do bom senso, era muita zoação, muita brincadeira. E não é que determinado dia eu estava apresentando um programa, e no microfone nada menos que a divina Elizeth Cardoso. Eu anunciava o nome da música, e ela cantava. De repente, vi ao fundo meus amigos da agência Asa, o Edgard Melo, Hélio Faria pai, e outro de quem não recordo o nome. Dei um sinal para eles, todos fãs da Elizeth, e eis que o quarteto sobe, invade o palco para ver a divina de perto. E não é que passaram a cantar com ela? Um episódio inesquecível da Inconfidência que mora no meu coração”.


“Bem, é só. Já falei demais por hoje. Mas volto em breve, pra fazer a memória trabalhar. É o melhor remédio para o idoso, os médicos já dizem isso”.


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